Barbara Coimbra



um dia o futuro vem te buscar, até lá, Prudence, porque não sai para brincar?



Não sei onde eu tô indo, mas sei que eu tô no meu caminho.

“Estudei numa escola experimental,
O meu pai é fotógrafo profissional,
Minha avó faz mapa astral legal.”

Estávamos no carro voltando de Petrópolis, aquela coisa, eu era só amiga mas todo mundo dizia que era namorada, e era quase isso mesmo. E a mãe dele, a de pés pequenos, dizendo que tinha estudado numa escola tipo a minha, mas ela não gostava não, falou dos índices de suicídio e o caralho a quatro, que era por isso que ela era assim. Eu, eu gostava, aliás, gostar era pouco. Lembro muito bem de quando entrei pela primeira vez pelo muro amarelo, a primeira coisa que eu perguntei, realmente, foi dos índices de suicídio, mas fiquei mesmo espantada foi com o tamanho, eu estava saindo de uma igreja metodista cinza para ir para um jardim colorido, aquilo ali era, literalmente, uma casa. E que casa, foi mais casa pra mim do que a onde eu dormia. Quando eu ficava triste, fugia pra lá, subia na árvrinha, passava a tarde inteira rondando o pátio de três metros. Acabei virando estagiaria do professor de artes visuais, foi lá também que descobri que queria ser professora, de artes visuais. Nada minimamente parecido com aqueles metodistas loucos que chamaram meus pais, mas eram loucos mesmo!, foram reclamar que eu tinha pulado o muro pra fugir da escola, idiotas, e tinha mesmo. A mãe dele olhava pra trás e brincava comigo, enquanto dirigia, e ele enlouquecia mandando a mãe segurar o volante, ela nem aí..., cantando pra mim, adaptando pra mim Que estudei numa escola experimental, o meu pai era fotógrafo profissional, minha avó fazia mapa astral legal, e o pior era que fazia. Dentro daquele carro eu nem imaginava que ia mudar de casa, pra uma bem parecida, também de muro amarelo, a dos mais velhos. E eu mudei, e quando entrei lá pela primeira vez eu vi: eu ia pular muito aquele muro. E pulei, pulei, pulei. O sistema era legal, a minha turma era legal, não sei bem porque eu não gostava, mas não gostava mesmo. Eu odiava aquele lugar, não tanto quanto a igreja metodista, mas era foda pra mim. Quando eles começaram a reclamar que eu pulava o muro no fundo do quintal da escola eu parei de ir. Parei, assim: Parei. Só voltei uns meses depois, não tanto pela minha mãe choramingando, e mais porque caiu a ficha que as faltas iam me repetir. E repeti. Mudei pruma outra, tive que fazer prova e tudo. Federal, e as pessoas olham com orgulho, eu passo na rua e os olhinhos brilham para o meu distintivo. Distintivo escroto. Uniforme escroto. Ô sisteminha medíocre, mas é aquela coisa, é publico, eu tenho que passar de ano... é só uma fase, são só os melhores anos da minha vida trancafiada numas grades azul marinho com uns inspetores pervertidos fiscalizando a altura da minha saia e se certificando que a meia branca não tem detalhes coloridos. E daí que eu não me socializo, são só dez minutos de intervalo mesmo... Nada, nada que eu pudesse comparar com o chegar na casa amarela depois de um mês inteiro faltando, jogar uma havaina prum lado, a outra pro outro e me estirar no chão pra pegar o sol da manhã.
Hoje eu voltei lá onde eu repeti. Onde eu jurei que nunca mais ia entrar, onde eu desejei mais que tudo não estar, vi uma formatura linda, linda, e sabe, ainda me sentia parte daquilo, e imagino como vai ser ano que vem, vendo todo mundo indo embora do colégio, nunca mais vão ter aula de química!, e as fotos vão aparecer no telão, e os professores vão dar os diplomas e as maçazinhas e eles vão estar emocionados e tudo mais, alguns vão pra faculdade, outros vão arrumar um trampo, tem gente que vai até pra Israel. Eu não, eu estarei pulando o muro com o Zezinho no fundo do quintal da escola, eu sempre estive lá.



Se você quiser contar comigo é melhor não me chamar pra jogábola

Uma cena que eu nunca vou esquecer foi o campeonato de futebol do colégio.
Enquanto o resto da turma se juntava pra bate uma bola,
eu pulava o muro no fundo do quintal da escola.



O Maior Amor do Mundo