Idéia para um Peça
- Me devolve, vou saltar agorinha...
[Ele de máscara de teatro, rindo e chorando ao mesmo tempo – ele sempre usa esta mascara -, amarrando a faixa na cabeça, a faixa mais colorida e bonita que já existiu, com fios trançados a ouro. Um azul, vermelho e roxo que causava êxtase.]
- ‘Peraí, vou saltar com você...
Uma voz em off: Ele sempre saltava com ela, sempre não, sempre é exagero, fazia já algumas semanas que não saltava no primeiro ponto depois da curva, que não pegava o mesmo ônibus. Muitos desencontros.
[Eles saltam numa ruazinha cinza, conversando besteiras, de palhaços a reis, mas não deixam de se encarar no silêncio dos intervalos, na pausa de cada palavra, um desconcerto de olhar para o lado, procurando não olhar o nada, mas isso só da parte dela. Ele não, ele nem nota, já notando desde sempre. E passam da casa dela]
- Me acompanha. [ele diz, tudo acontece de forma bem exagerada, tudo teatral, oferece o braço, riem e tal e coisa e coisa e tal.]
[Param numa esquina, uma brincadeira com chapéu e outra com faixa, umas histórias para contar, nada demais.]
- É melhor assim, arrumado fica feio
- É ‘tá uma bosta... Estou deixando crescer. [ela mexendo no cabelo.]
[As mãos estão juntas, n’um eu-sinto-o-que-você-sente-e-você-sente-o-que-eu-sinto.
Ela desvia de um beijo, de um abraço, de um toque qualquer, segurando a mão, sem nunca soltar a mão.]
- Não, dá... não dá... [mexendo nos botões. Vira uma quase discussão, que não se tem o que discutir. Toca o celular, dela. Tudo com um ar meio Desapontado.]
E na verdade nada mais que interesse... nada mais que tenha graça, não que tivesse antes. Mas o final fica bonito:
- Estou indo.
-Ah, não... não... [conformado, mas esperando um augúrio de Deus]
-depois a gente se fala.
-depois a gente se fala. [Ele diz em eco, os dois se viram, e andam em frente, sem olhar mais p’ra trás. Ela vira a esquina aos tropeços. não chora. E espera o elevador sem perceber que ele já chegou pensando em escrever uma peça.
Ele eu não sei, não olhei mais para trás.].