Barbara Coimbra



Idéia para um Peça

- Me devolve, vou saltar agorinha...
[Ele de máscara de teatro, rindo e chorando ao mesmo tempo – ele sempre usa esta mascara -, amarrando a faixa na cabeça, a faixa mais colorida e bonita que já existiu, com fios trançados a ouro. Um azul, vermelho e roxo que causava êxtase.]
- ‘Peraí, vou saltar com você...
Uma voz em off: Ele sempre saltava com ela, sempre não, sempre é exagero, fazia já algumas semanas que não saltava no primeiro ponto depois da curva, que não pegava o mesmo ônibus. Muitos desencontros.
[Eles saltam numa ruazinha cinza, conversando besteiras, de palhaços a reis, mas não deixam de se encarar no silêncio dos intervalos, na pausa de cada palavra, um desconcerto de olhar para o lado, procurando não olhar o nada, mas isso só da parte dela. Ele não, ele nem nota, já notando desde sempre. E passam da casa dela]
- Me acompanha. [ele diz, tudo acontece de forma bem exagerada, tudo teatral, oferece o braço, riem e tal e coisa e coisa e tal.]
[Param numa esquina, uma brincadeira com chapéu e outra com faixa, umas histórias para contar, nada demais.]
- É melhor assim, arrumado fica feio
- É ‘tá uma bosta... Estou deixando crescer. [ela mexendo no cabelo.]
[As mãos estão juntas, n’um eu-sinto-o-que-você-sente-e-você-sente-o-que-eu-sinto.
Ela desvia de um beijo, de um abraço, de um toque qualquer, segurando a mão, sem nunca soltar a mão.]
- Não, dá... não dá... [mexendo nos botões. Vira uma quase discussão, que não se tem o que discutir. Toca o celular, dela. Tudo com um ar meio Desapontado.]
E na verdade nada mais que interesse... nada mais que tenha graça, não que tivesse antes. Mas o final fica bonito:
- Estou indo.
-Ah, não... não... [conformado, mas esperando um augúrio de Deus]
-depois a gente se fala.
-depois a gente se fala. [Ele diz em eco, os dois se viram, e andam em frente, sem olhar mais p’ra trás. Ela vira a esquina aos tropeços. não chora. E espera o elevador sem perceber que ele já chegou pensando em escrever uma peça.
Ele eu não sei, não olhei mais para trás.].



é fraco e fácil de ser forçado.

Ela tem um desenho igual o meu, e um gemido em meio a neblina de dentro do corpo, um olhar perdido de baixo da árvore se perdia nos carros, se perdia na neblina clara e espessa, neblina branca, mas tão branca quanto céu de agosto quando chove, que chove claro e espesso, chove e pinica a ponta do nariz, coça, coça... É assim quando, em agosto, chove.
Mas não era agosto. A chuva nem se notava chuva, eram uns pingos grossos e pesados, separados, às vezes sim, às vezes não. Era um dia claro e bonito de céu azul e voluntários da pátria, e nos refugiamos embaixo de uma árvore pequena e baixa O sangue da minha perna não estancava, e tinha sido um cortezinho tão pequeno, tão de leve, tão de nada... Quando ela mostrou a poesia, fiquei besta, era igual o meu sangue, mas em nanquim. Em potinho de nanquim e ponta 0.1, fraquinha..., e os desenhos... fraquinhos, apesar de tanta tinta, tanta, tanta tinta.
Mas aí a página virou. E já era de eu esperar, tudo sempre surpreende nessa menina de pena e antena laço no pescoço. Tudo sempre surpreende e é tão... É incrível como as reticências são, na verdade, interrogações, de duvidas tão duvidosas que nem se atrevem a perguntar. Elas têm medo e entalam na garganta, nem mesmo sabem o que são, nem mesmo se formulam, que na névoa de dentro do corpo, branca e espessa, nada se formula além da dúvida de se ser duvida. O monstro do Sim-Não da história do Romualdo, Vou Ali e Volto Já, que minha mãe lia pra mim quando eu era pequena.
Pequena, ele a chama de Pequena. Assustador, não?



Para o Portal 818

O amor é para ser distribuído
E não amor fingido porque ele causa dor
O amor é o campo da formosura
Onde está minha imagem pura, Deus foi quem criou
O amor é o trono da verdade
Onde está a majestade, Cristo Nosso Senhor
O amor deve ser bem profundo
Em todo mundo, e para quem acreditou
O amor é o trono de harmonia
Aonde eu descanso, e rezo todo dia
O amor é da Sempre Virgem Maria
Jesus Cristo Salvador, Ele é quem nos guia



Rompante 7.4


que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda que merda aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa!!!!!!!!!



Rompante 7.3

Eu tinha me esquecido o quanto é angustiante ver teu texto da angústia, te imaginar quebrando o copo, ele limpando teu sangue. Eu tinha me esquecido de toda essa merda que é imaginar vocês se abraçando e seu sorriso idiota. Seus braços de polvo, escrota. e esses palavões que me vem na cabeça, que só vão descendo o nível, e a minha vontade de abraçar os braços de polvo, a minha paixão pelo sorriso idiota, que merda, que merda... porque você me faz criança-com-bola-espirrando-sangue? porque sou eu que estouro as suas bolhas? Eu tinha me esquecido o quanto é horrível ter esses rompantes, o quanto eu odeio ouvi-lo te chamar de "Lu". AAAAAAAA que raiva, e porque é que eu choro?



Luz


o dela é com s o meu é com z.

é uma mistura de ternura
e rompantes de medo.



Dos Nossos Desejos

Não posso te desejar nada de mal, nem que eu quisesse...
Mas se eu pudesse, desejaria?
Eu te desejo olhos brilhantes, mas não sou tão segura para vê-los brilhar.
Eu te desejo que não deseje que ele te busque na escola, por favor, não deseje...



uma música bonita de um texto estranho

"Canta, ó Deusa da Sabedoria, a majestade do fogo!
Levantemos nossas taças e brindemos pela Hierarquia das Chamas...
Escancaremos nossas ânforas de ouro e bebamos o vinho da luz até embriagar-nos...
Ó Demóstenes! Quão rápidos foram teus pés em Queronéia...
Mesmer, Cagliostro, Agripa, Raimundo Lulle, a todos conheci, a todos vi, e os chamaram loucos.
De onde tirastes vossa Sabedoria? Por que a morte selou vossos lábios? Que se fizeram de vossos conhecimentos?
Beberei o vinho da sabedoria esta noite, no cálice de vossos augustos crânios e num gesto de rebeldia onipotente me rebelarei contra a antiga dificuldade.
Romperei todas as cadeias do mundo e me declararei imortal, mesmo que me declarem louco...
Empunharei a espada de Dâmocles e farei ruir o inoportuno hóspede...
Porém, não poderás contra mim, muda caveira, porque sou Eterno...
Cristo Ígneo, Cristo ardente, levanto meu cálice e brindo pelos Deuses, e Tu, batiza-me com fogo...
De onde surgiu esta enorme criação?
De onde surgiram estas imensas massas planetárias que, como monstros milenares, parecem sair das fauces do Abismo, para cair noutro mais terrível e espantoso que o primeiro?
Levanto meus olhos ao alto e sobre a cabeça ígnea do maior de todos os sacrificados leio esta palavra: INRI. IGNIS NATURA RENOVATUR INTEGRAM (O Fogo Renova Incessantemente toda a Natureza)."

Pô cara, Irado!



Esperando ser acordada de madrugada

Como eu te idealizei todos esses anos, como eu te esperei, tantos, tantos anos...
E eu vivi cada minimo instante como você, sem você por perto, ms como um espelho epistemológico seu, como um passado reconfigurado em carne e sangue e dor e amor. Cada minimo instante como você, como idealizei, como esperei, mesmo sem esperar, mesmo sem perceber que era você, Laura, que era você que me acordava de noite vestida de vampiro e desenhava na cortina e colava coisas na parece, e eu chorava de madrugada, que você me assustava com esses rituais, as olheiras e as roupas pretas, e você ria, me abraçava e dizia que eu era sua vampirinha que eu era igual a você. E eu tinha vergonha, que não queria ser igual a você, mesmo que no fundo quisesse, mesmo que no fundo fosse, eu só estava sendo eu menininha de sete anos, de doze, quatorze, dezesseis. E de gothicpunkemoposerbunkercultindieneohippieespiritualizada é tudo assim da mesma fora, branca de cabelos pretos, bochechas rosadas e pêlos. E então vejo você amanha, como sonhei durante todos eses anos, esperando ser acordada de madrugada. É assim tão fácil? Eu quero é ir embora com você